quarta-feira, 25 de julho de 2012

Lean Healthcare e a Acreditação Hospitalar

Por Jaime Gil Bernardes


Muitas vezes os gestores deixam de implantar ferramentas de gestão por vários motivos, sendo o motivo principal o desconhecimento destas ferramentas ou pela soberba de acreditar que podem resolver tudo sozinhos, sem ajuda de nada e de ninguém
Em outros casos, acontece exatamente o contrário, onde os gestores tendem a absorver qualquer tipo de novidade, entupindo de trabalho os seus colaboradores, muitas vezes fazendo com que a ferramenta implantada seja o fim, o objetivo final, ao invés de encarar que isso seria tão somente o meio de se chegar a uma excelência administrativa.
Com certeza a dose certa é aquela suficiente e necessária (mínimo e máximo) para alcançar os objetivos estratégicos determinados. Nem fazer tudo, nem não fazer nada, nem fazer com que as ferramentas sejam um peso para organização, nem fazer com que as ferramentas entrem em choque de objetivos.
Então, me paro a pensar sobre a implantação do Lean Healthcare em uma organização hospitalar que já possui certificação de acreditação (ou que esteja buscando a certificação) e como estas ferramentas podem ser complementares e não colidentes, permitindo que sejam implantadas em conjunto.
Mas antes de explicar como isso funciona, cabe lembrar que a Acreditação Hospitalar é uma ferramenta excelente de gestão e que o seu objetivo é melhorar a qualidade assistencial, sendo que o certificado de acreditado não é o “tudo”, mas conseqüência deste trabalho. Cabe destacar, ainda, que o Lean Healthcare é a evolução do Lean Manufaturing (Sistema Toyota de Produção ou mentalidade enxuta), sendo adaptado ao setor de saúde, onde se visa fazer mais com menos recursos, eliminado desperdícios, fazendo apenas e tão somente aquilo que realmente agrega valor ao cliente.
Então, apresento e descrevo o fluxo abaixo:

No momento em que ambas as ferramentas estão trabalhando em conjunto, sendo que a Acreditação visa a segurança do paciente e a qualidade assistencial, o Lean Healthcare provoca a pensar como estes processos poderiam ser mais enxutos, sem desperdícios, visando efetivamente a fazer apenas o necessário. Ou seja, a Acreditação determina o mínimo a ser feito e o Lean Healthcare determina o máximo. Em ambas as ferramentas a gestão de processos é fundamental.

Estas ferramentas em conjunto proporcionam que os processos gerem valor agregado ao cliente (paciente, médicos, acompanhantes, planos de saúde, SUS, comunidade). Além disso provocam a mudança de cultura corporativa, fazendo com que esta cultura seja adequada às atividades e para a organização. Isso favorece o ambiente de melhoria contínua, fundamental para as organizações nos dias de hoje. Perceba que as tônicas se baseiam em processos, mudanças e melhorias.
Claro que isso tudo suportado por uma boa (e adequada) grade de indicadores e por muito e muito treinamento.
Ao final desta união, temos a sustentabilidade da organização por um resultado financeiro adequado, lembrando que estamos fazendo o mínimo necessário e o máximo suficiente para atingir os objetivos. Claro que a segurança do paciente está implícita no processo de acreditação. Isso tudo implica em valor ao paciente (o objetivo final de um hospital é a cura). 
Paralelamente, o Lean Healthcare provoca a discussão e os planos de ação visando reduzir e eliminar desperdícios nos processos, bem como a própria definição e a gestão dos processos.
Consequentemente, as pessoas da organização estarão mais envolvidas nos processos, mais motivadas e mais felizes.
Portanto é possível juntar estas duas ferramentas, e até me atrevo a dizer que são complementares e que deveriam trabalhar em conjunto.


Leia também: Mentalidade Enxuta nos Hospitais - LEAN em Hospitais

segunda-feira, 23 de julho de 2012

Gestão de Processos em Hospitais Parte 3: Por que gerenciar processos em hospitais é mais complicado?

Por Jaime Gil Bernardes
Um diálogo que pode ser ouvido em qualquer organização:
- Porque os processos são feitos desta maneira?
- Não sei. Quando cheguei aqui, já era assim.
- E ninguém questionou isso?
Essa é uma realidade na maioria das organizações e principalmente nos hospitais, onde a resposta a última questão seria:
- Aqui ninguém tem tempo para ficar analisando processo, pois a saúde paciente é mais importante. Além disso são muitos processos e seria impossível analisar todos eles. E pior, as regras da vigilância sanitária, dos convênios, dos conselhos de medicina e de enfermagem não permitem que nada seja mudado. E pra que mudar se está dando certo assim?
Note-se que sempre haverá resistência para a mudança em qualquer setor, mas no caso de hospitais esta resistência é muito maior, influenciada pelos aspetos que são incorporados aos modelos mentais existentes.
Não precisamos pensar o tempo inteiro em mudar processos. Não precisamos mudar “todos” os processos. As mudanças farão com que a cura do paciente seja mais rápida ou menos desgastante. O importante é mudar sempre para melhor.
Mas porque temos esta dificuldade maior em gerenciar processos em hospitais. Uma razão primária que ocorre é que nunca haverá um produto (paciente e sua cura) igual ao outro. Mas os processos que cercam este paciente e sua cura têm que ser sempre regulares, pois os protocolos existem exatamente para isso, corroborados pelos sistemas de qualidade da própria acreditação.  
Henry Ford já padronizava os processos com sua linha de produção, onde visava produtividade. Dizia que os consumidores podiam ter o carro da cor que quisessem, deste que fossem pretos (não havia uma preocupação com a satisfação do consumidor). Entretanto este pensamento de produtividade não se usa mais nem na indústria, pois já passou pela fase da qualidade e hoje já está na fase da excelência, onde o que importa é criar valor ao cliente.
Mas então não devemos padronizar os processos em hospitais? Sim e não. Temos que padronizar, analisar, melhorar, mudar, manualizar, padronizar, analisar novamente, melhorar novamente, e fazer um ciclo contínuo até chegar um processo ótimo.
Além disso, a gestão de processos se torna mais difícil nos hospitais por causa de algumas variáveis que descrevo a seguir, numa comparação de como são os processos na indústria, na prestação de serviços e nos hospitais (variáveis descritas a partir de um texto de Lima Gonçalves).

Características que diferem a análise dos processos nos serviços, na indústria e nas organizações hospitalares
Característica
Manufatura
Serviço
Organização Hospitalar
Propriedade (quem é o responsável)
Definição geralmente clara
Tende a ser ambígua ou o processo tem vários donos
Existe uma discussão muito grande na participação do médico no processo, no momento em que ele é responsável pelo paciente mas, como autônomo, não é integrante da organização.
Fronteiras (pontos inicial e final)
Claramente definidos
Pouco nítidas, difusas
Os processo podem seguir uma linha de ação, mas, tanto no processo assistencial como no burocrático, pode sofrer um revés e voltar para a fase inicial, bem como pular muitas das fases.
Pontos de controle (regulam a qualidade e dão feedback)
Estabelecidos de forma clara e formal
Frequentemente não existem
Alguns existem, conforme protocolos operacionais
Medições (base estatística do funcionamento)
Fáceis de definir e gerenciar
Difíceis de definir, geralmente não existem
Existe, difíceis de controlar
Ações corretivas (correção de variações)
Muito freqüente as ações preventivas
Geralmente ocorrem de forma reativa
Nos processos assistenciais não há possibilidade de ações corretivas. Nos processos administrativos ocorrem de forma reativa.
Adaptado de LIMA GONÇALVES (2000) citado em LOWENTHAL (1994).

Se a organização hospitalar não fizer um trabalho de base, coerente e definitivo na gestão de seus processos, as variáveis descritas acima não se resolverão sozinhas, se complicando cada vez mais. Esta decisão de gerir processos, mesmo que seja difícil, deve ser feita, pois após a incorporação da gestão de processos na cultura organizacional, esta tende a fluir, pois as pessoas estarão predispostas à melhoria contínua, trazendo como conseqüência a continuidade e a perpetuidade da organização hospitalar.

O que importa na gestão de processos é como queremos organizar o trabalho agora, frente a nova demanda de pacientes, patologias, processos burocráticos, fornecedores e tecnologias. Além do mais, não existe processos com sinergia se não houver trabalho em equipe.


Veja também: 
Por que Gerir ou Analisar Processos em Hospitais - http://goo.gl/jhGR8 
Gestão de Processos em Hospitais - http://goo.gl/STKu4

Gestão de Processos em Hospitais Parte 2: Objetivos e Benefícios - http://goo.gl/2LS60

sexta-feira, 13 de julho de 2012

A Filosofia Lean na Cadeia de Suprimentos Hospitalar.

A cadeia de suprimentos em hospitais, assim como em organizações de outros setores da economia, está interligada com todos os departamentos e possui grande influência nos resultados e processos. A mudança de cultura oriunda da globalização tem forçado as empresas a conviverem com fornecedores, prestadores de serviços e clientes de todas as partes do mundo, uma vez que atrelado a esse novo comportamento, esta inserida a pressão por resultados, melhores serviços, inovação e relacionamentos.
Devido à filosofia Lean, hoje as empresas dependem dos resultados logísticos para oferecer vantagens competitivas, como agilidade, preço, qualidade, precisão de compras, estoque e distribuição, para com isso atrair investidores e valorizar a marca no mercado de ações.
Com a ajuda da tecnologia da informação, é possível gerenciar a cadeia de suprimentos em hospitais de forma prática, observando os fluxos, os indicadores, as necessidades e quaisquer informações que o gestor considerar relevante. Uma análise macro da atual economia mundial, podemos verificar que houve um declínio no poder aquisitivo das empresas e consequentemente das pessoas, fato que em alguns países se encontra em situação diferente no caso do Brasil, mas afeta o comportamento dessas empresas e se faz necessário desenvolver planos de trabalho Lean, iniciando pela cadeia de suprimentos em busca da redução de mão de obra, equipamentos, matéria prima, entre outros componentes geradores de custo.
O Lean vem justamente nesta contramão de gastos superficiais nos hospitais e exagerados sem controle e fiscalização. Porém, a ausência de valores, como sustentabilidade na área de saúde juntamente com a falta de preparo desses profissionais, resulta nas atuais condições da saúde pública do país. Como ainda estamos aprendendo a trabalhar de forma racional, as inovações em tecnologia, métodos e processos de qualidade, ocorre em velocidade maior em comparação com o desenvolvimento dos profissionais.
O conceito define que a cadeia de suprimento deve ser estruturada onde a formulação do preço deve se basear igual ou abaixo do mercado, com qualidade superior. O segredo para esta vantagem competitiva está na cadeia de suprimentos, uma vez que a racionalização dos fluxos, padronização dos processos, terceirização de serviços pontuais, levam a empresa a reduzir os desperdícios e aumentar a lucratividade não no aumento do preço e das vendas, e sim dentro da própria empresa.
De forma similar, o consumo dos hospitais em recursos materiais, faz necessária uma gestão sustentável da cadeia de suprimentos com os seguintes objetivos:
·        Redução do desperdício;
·        Organização dos fluxos;
·        Vantagem competitiva;
·        Lucratividade.
Nos hospitais, ainda existe uma lógica baseada apenas na distribuição dos materiais e controle dos mesmos, sem considerar critérios de compra, demanda, perfil, seleção de fornecedores, onde são necessárias grandes quantidades de estoque para supostamente evitar riscos e oferecer segurança na distribuição do hospital. Nesse fluxo, é esquecido o custo de estoque, e os riscos inseridos nessa gestão como, armazenagem, validade, furto e outros.
Como o estoque é na realidade, dinheiro investido, devemos ser muito criteriosos quando gerenciamos esses recursos. De tal forma, o mapeamento de fluxo das áreas ligadas à cadeia de suprimentos pode ser caracterizado por uma pirâmide invertida da seguinte forma:
1.     O cliente final precisa ser curado e bem cuidado;
2.     Para atender as necessidades deste cliente as equipes assistenciais precisam de suporte, (insumos, transporte, infraestrutura, equipamentos);
3.     O suporte precisa ser planejado e estar disponível, (distribuição de materiais, meios para transportar, layout, manutenção preventiva e corretiva);
4.     A disponibilidade precisa ser pré-definida, (planejamento, demanda, compras, estoque, analise financeira, payback);
5.     Os profissionais precisam estar alinhados com a política da empresa, e gerenciar os relacionamentos com fornecedores, médicos, terceirizados, (limpeza, SND, SADT, etc).
Através deste exemplo podemos verificar a influência que a cadeia de suprimentos possui dentro e um hospital, e envolve a equipe de enfermagem, os médicos, áreas financeiras como, faturamento, contabilidade, contas a pagar, setores de apoio e empresas terceirizadas.
A experiência do Lean em ambientes hospitalares proporciona uma visão de ganha-ganha, por meio de parcerias com toda a cadeia hospitalar e oportunidades de estabelecer um fluxo ideal com fornecedores e clientes.

Texto originalmente publicado em http://goo.gl/HKbzp

segunda-feira, 2 de julho de 2012

Caminhada Gemba: andando e conhecendo sua própria empresa

Por Jaime Gil Bernardes
A caminhada gemba é uma ação de extrema importância para a melhoria de processos em uma organização.
Começo contando uma antiga história: Um empresário, mergulhado em dívidas e com pouca eficiência operacional em sua empresa e não tendo mais para onde se socorrer, resolveu procurar ajuda espiritual junto a um velho sábio. Ao explicar-lhe o problema, o sábio alertou-o que faltava em sua empresa um pouco de fé. Aconselhou-o a colocar cinco imagens de santos, um em cada canto da empresa e uma bem no meio. E deveria, todos os dias, fazer uma oração em cada imagem, tendo o cuidado de sempre alternar a ordem dos santos e nunca fazer o mesmo caminho em direção a cada imagem e nem fazer isso no mesmo horário. Algum tempo depois, a empresa saiu da crise e prosperou, com ajuda destas orações diárias do empresário.
Mal sabia ele que estava praticando a caminhada gemba. Uma dos mandamentos do Lean Manufaturing, onde é importante ir até onde as coisas ocorrem, conversar com as pessoas que executam, ficar a par dos problemas e das soluções in loco, sentir com todos os sentidos, ter a notícia direto da fonte.
GEMBA é uma palavra japonesa que em português representa o local onde as coisas acontecem, sendo, portanto, o ambiente operacional de uma organização, seja o chão de fábrica, a área de estocagem, a sala do call center, a loja, a oficina, o corredor do escritório, etc.
O pior lugar para se ver o mercado é do escritório. O pior lugar para ver a sua empresa também é do escritório.
Cada caminhada gemba deve ser um momento especial. Vá e sinta com todo os seus sentidos. Olhe o lay out. Sinta a motivação das pessoas. Veja se está tudo limpo. Perceba se não há atividades desnecessárias. Ouça as reclamações e sugestões. Toque nas pessoas. Sinta o cheiro dos produtos. Deguste a sensação que a empresa está andando conforme foi definido na estratégia. E isso não somente no horário normal do expediente, pois muitas coisas acontecem, também a noite.
Não basta olhar apenas por indicadores: tem que sentir como estes indicadores estão acontecendo, principalmente no que se refere a indicadores de recursos humanos e indicadores de desperdícios.
Se você só ouvir pelos outros, vai ter a opinião dos outros e nunca vai ter sua própria opinião. No final os outros estarão mandando mais que o líder, pois as informações começam a chegar filtradas, ao bel prazer de quem trouxe a informação.
Isso acontece, também, com a leitura alguns livros de administração que resumem as teorias de outros autores, onde, por preguiça, lemos estes resumos e deixamos de ter o entendimento por completo do que aquele autor original queria dizer, além de sermos conduzidos por conclusões de terceiros e não nas conclusões que o próprio autor queria nos transmitir.
Isso remete, ainda, aos modelos de planejamento estratégico. Alguns são descritivos, botton up, onde os funcionários podem (e devem) opinar como será o planejamento das ações estratégicas, sabedores do que ocorre no dia a dia da organização. O outro modelo é o prescritivo, top down, onde o gestor prescreve como serão as ações, assim como um médico prescreve um remédio a um paciente. Apenas prescreve e espera que suas ordens sejam “cumpridas”.
Em meus trabalhos de consultoria sempre convido o gestor a fazer duas coisas: andar pela sua própria empresa e olhar a empresa de fora, sob uma ótica exterior. É muito interessante como o gestor começa a perceber coisas que estavam sempre a sua frente e que não foram percebidas. Muitas vezes coisas simples, como a falta de lixeiras, outras vezes aspectos complexos, como o excesso de pessoas apenas andando pela empresa, sem fazer nada.
Portanto, faça a caminhada gemba, seja diariamente, seja uma vez por semana: mas faça. Você vai se surpreender com o resultado.
Veja mais:

Caminhadas pelo Gemba com Jim Womack - http://goo.gl/xM5kR

Modelo de Gestão: Faça o 'Genchi Genbutsu' - http://goo.gl/1qckq