segunda-feira, 6 de julho de 2015

A imbecilidade de se contratar "pessoas de confiança"

Por Jaime Gil Bernardes

Uma prática ainda em uso nas empresas é contratar "pessoas de confiança", atribuindo, assim, o porquê estas pessoas fazem parte do quadro funcional, sendo que muitas vezes são pessoas sem a devida capacidade para exercer os cargos onde estão clocados..

Acredito que esta seja umas das maiores imbecilidades de toda a técnica administrativa, pois quando se rotula um funcionário como "pessoa de confiança", estamos deixando de lado muitos outros valores exigidos por qualquer analista de recursos humanos, como liderança, proatividade, conhecimento técnico, capacidade de resolver problemas, hands on, e tantos outros atributos significativos.

Todos nós somos de confiança, até que oportunidades aconteçam. E estas oportunidades devem ser travadas com um bom método de controle interno e com relatórios gerenciais oportunos. Ou seja, não precisamos ser rotulados como "de confiança".

Sinceramente, prefiro ser contratado pelo profissionalismo e pela capacidade de dar retorno à organização do que ser rotulado como de confiança. As empresas precisam é de profissionais qualificados.

Muitas vezes se observa que estes "de confiança" são na verdade os "fofoqueiros", os "leva-e-traz", aqueles que sugam os recursos da empresa sem contribuir.

Ainda bem que esta prática está em desuso, mas ainda existem muitas empresas que se utilizam deste pseudo-profissional.

sexta-feira, 3 de julho de 2015

Lean IT: como agregar valor e evitar desperdícios na cadeia de informação

Por Flávio A. Picchi
Vice-Presidente Lean Institute Brasil


As aplicações do pensamento lean são cada vez mais abrangentes, chegando a praticamente todas as áreas e funções das organizações. Mas, em muitas empresas, vemos os setores de TI ainda à margem da jornada lean. Será que isso faz sentido?

A Tecnologia da Informação (TI) é, sem dúvida, um dos maiores propulsores de mudança na forma como as empresas agregam valor a seus clientes e aumentam sua produtividade. Mas é também uma das maiores fontes de desperdícios.

Do ponto de vista da agregação de valor, todos reconhecem que a TI, cada vez mais, muda a vida das pessoas, facilita as interações entre empresas e clientes e agiliza processos internos.

Mas existe também o “lado negro”. Um estudo clássico, realizado anualmente pelo Standish Group, mostra que somente 39% dos projetos de TI são entregues dentro do previsto, 43% apresentam problemas (custos e/ou prazos excedidos) e 18% nem chegam a ser entregues.

Os estouros médios são de 59% em custos e de 74% em prazos. Das funcionalidades entregues, 65% não são usadas, 15% são parcialmente usadas e somente 20% são usadas apropriadamente.

As consequências disso podem ser vistas na maioria das empresas: de um lado, áreas demandantes, reclamando da “fila” aguardando por soluções da TI; do outro, os setores de TI, sobrecarregados e pressionados quanto aos custos.

TI é também uma área que consome uma parcela significativa de investimentos e despesas. De acordo com o Gartner Group, em 2014, as empresas gastaram em média 2,5% de suas receitas em TI, sendo que companhias de alguns setores, como saúde e finanças, atingiram mais de 5%.

Sendo uma área de tamanha importância, tendo em vista valor, desperdícios e recursos envolvidos, a Tecnologia da Informação não pode estar fora do foco do lean. Diversos enfoques surgiram nos meios de desenvolvimento de software com esse objetivo, sendo, muitas vezes, identificados pelo termo em inglês Lean IT.

Um breve histórico

O processo de desenvolvimento de software tradicional baseia-se em rígidas especificações no início do processo, desenvolvimento em cascata e entregas em grandes lotes. Esse modelo começou a sofrer críticas, pelos grandes desperdícios que gera, citados anteriormente.

Em 1999, o conceito de XP-Extreming Programing trouxe uma proposta de mudanças radicais no processo de desenvolvimento de software, com foco na organização do time para gerar software de qualidade, com produtividade em ciclos curtos, aceitando mudanças como algo natural.

Em 2001, um grupo de profissionais da área de software lançou o Manifesto Ágil. Seus princípios abordam diversos aspectos que têm grande proximidade aos conceitos lean, como a prioridade em atendimento ao cliente, entregas frequentes, flexibilidade e motivação da equipe.

Na busca pela aplicação desses princípios, surgiram diversas “práticas ágeis”. Algumas alteram a gestão do processo de desenvolvimento tradicional, sendo uma das mais difundidas o Scrum, na qual podemos reconhecer diversos conceitos lean, como: interações frequentes com o cliente, entregas em pequenos lotes, gestão visual, trabalho em equipe e reflexão a cada ciclo de entrega.

Outra prática que também muda o processo tradicional de desenvolvimento é o Kanban, que busca o fluxo contínuo através de forte gestão visual.

Diversos conceitos e ferramentas de engenharia de software se desenvolveram, apoiando a criação de fluxo e qualidade na fonte. São exemplos disso: o TDD-Test Driven Development, as metodologias que integram e automatizam o ciclo desenvolvimento-teste-integração-entrega, e a busca da integração de desenvolvimento e operação (DevOps).

Na discussão sobre ferramentas que poderiam compor o conceito de Lean IT, muitas vezes, enfoques provenientes de outras tradições são lembrados. Por exemplo, o ITIL e o COBIT, cujos pontos mais fortes estão na sistematização de melhores práticas. Embora sejam enfoques que não vêm da tradição lean (pode-se reconhecer semelhanças com o enfoque PMBOK, por exemplo), contribuem para a estabilização e padronização de processos, aspectos fundamentais para um ambiente lean.

Já o enfoque CMMI, recebe de muitos na comunidade de TI as mesmas críticas que os sistemas de certificação (por exemplo, ISO 9001) geram em outros ambientes: o de exigirem muita formalização sem resultados na mesma proporção.

Mary Poppendieck, uma das pioneiras em buscar um enfoque mais amplo na área de Lean IT, aponta como elementos fundamentais nesse processo: faça a coisa certa (entenda o real valor para o cliente), faça rápido (reduza o lead time), faça da maneira certa (garanta qualidade e velocidade) e aprenda por meio de feedback.

Eric Ries expande o conceito de feedback em seu livro “Lean Startup” com ciclos rápidos de aprendizado, testando hipóteses com o cliente final, ajustando o rumo ou persistindo, conforme o resultado.

Mary aponta também que o desenvolvimento de software é, na verdade, um subsistema de desenvolvimento de produtos (DP) e aponta os conceitos de Lean DP como totalmente aplicáveis.

É bom lembrar que as metodologias ágeis também despertam grande interesse dos envolvidos na aplicação lean DP, confirmando que essas áreas têm muito a aprender uma com a outra.

Muitos desses conceitos tiveram maior atenção do lado dos fornecedores (desenvolvedores) e menos da demanda (clientes internos e externos). Seria como se o sistema estivesse sendo mais empurrado que puxado.

Bell e Orzen, no livro “TI Lean”, apontam a necessidade da abordagem nos dois sentidos: para dentro, excelência operacional em TI, e para fora, integração com a melhoria dos processos de negócio. Esse livro foi pioneiro em explorar esse segundo aspecto da integração com o negócio.

Como tudo isso está chegando à TI corporativa

Enquanto a adoção desses conceitos tem sido rápida em empresas que entregam software como serviço – como Google, Spotify, ou startups e empresas que desenvolvem aplicativos móveis –, podemos dizer que, nas estruturas de TI corporativas, a aplicação disso tudo é ainda incipiente.

A transformação lean inicia, na maioria das empresas, nas operações (produção e logística); logo após, geralmente, expandem-se para os processos administrativos (lean office); com a maturidade da implantação, chegam até os sistemas de gestão e liderança.

Mas mesmo em companhias com uma jornada lean bastante avançada, é muito raro vermos as estruturas de TI envolvidas. Em alguns casos, não só se mantêm à parte, como acabam se tornando barreiras às mudanças.

Vemos, com frequência, esforços de simplificação, decorrentes do lean office, esperarem meses para obter uma mudança de sistema, entrando na interminável fila do backlog de TI.
Já presenciei em uma empresa dificuldades para implantar o kanban na produção, pois o sistema exigia inúmeras baixas de movimentações de estoque entre processos que haviam sido eliminados pela criação de fluxo.

Com os desperdícios e ruídos que existem ao longo da cadeia, a área de TI está cada vez mais sobrecarregada e se distancia cada vez mais das áreas de negócio, criando um círculo vicioso.

Como tudo no lean, entender que problema você quer resolver é o primeiro passo. Desenvolver um software com tais funcionalidades pode ser uma contramedida. Mas sem que todos os agentes da cadeia tenham antes entendido que problema precisa ser resolvido, isso pode levar a grandes desperdícios.

Participamos de um projeto em uma empresa de comércio varejista de produtos especializados que é um exemplo de como a área de TI buscou entender juntamente com as áreas de negócio qual era o problema a ser resolvido antes de perguntar que software precisaria ser desenvolvido.

Preparando-se para a implantação de um ERP, a companhia decidiu antes racionalizar alguns processos que apresentavam problemas. Os produtos certos não chegavam às lojas na hora certa e vendas eram perdidas, apesar de enormes estoques. Cobranças aos clientes apresentavam erros.

Trabalhando conjuntamente: TI, lojas, finanças, compras e fornecedor, eles conseguiram atingir as metas de redução de estoque e melhoria de atendimento, usando ferramentas como mapeamento de fluxo de valor, kanban etc.

A grande maioria dos problemas foram resolvidos com mudanças no fluxo, sem necessitar alterar uma linha de código. Transformações simples foram rapidamente incorporadas pela equipe de desenvolvimento de software, que entendeu exatamente o que seria necessário.

Se, nesse caso anterior, fosse utilizado o “sistema tradicional”, especificações detalhadas seriam feitas, sistemas pesados e caros seriam desenvolvidos, demorando muito tempo. A fila de software a ser desenvolvido teria recebido uma carga bem maior, e, possivelmente, o problema não seria totalmente resolvido.

A ideia de Lean IT ainda está em construção. Os conceitos lean específicos, aplicados às operações, desenvolvimento de produtos, office e desenvolvimento de software são, na verdade, apenas casos particulares da aplicação da filosofia lean.

As diferentes “tribos” envolvidas têm muito a ganhar se investirem mais no compartilhamento de conceitos e aprendizados, bem como na integração de esforços ao longo de toda a cadeia de valor.

Tecnologia da Informação é fator estratégico para o futuro de todas as empresas, exigindo um novo patamar de agregação de valor e eliminação de desperdícios. A comunidade lean tem a oportunidade de dar uma enorme contribuição para esse salto, reunindo conhecimentos e experiências que vêm sendo acumulados paralelamente em diversas áreas das empresas.

Originalmente publicado em www.lean.org.br